terça-feira, 19 de maio de 2015

Ser e Parecer

Hoje, no início duma conversa, perguntaram-me se eu era estrangeira.

Ri-me, e perguntei o porquê da observação.

A menina é alta e loura, podia ser inglesa, foi a resposta.

E contra argumentei, mas ainda não me tinha ouvido falar e já pressupunha coisas?...

E o meu interlocutor retorquiu: Pois é, com essa é que me calou!

Isto do Ser e Parecer tem muito que se lhe diga.
Tanto ao nível da aparência, bem como da outra, a interior, que só vêem os olhos do coração, da alma. Mais dentro.
Desde que me lembro de ser gente, que me lembro também do diz que disse, do ouvi dizer, aquela senhora diz que, consta que, existe o boato de....
E sempre foi dito de maneira tão natural, que quase parecia igual a uma ida ao café, ou a atender um telefonema, ou a uma qualquer rotina que tivéssemos numa determinada altura.
Ou seja, não se questionava. Ou eu não questionava, que não tinha ainda idade.

E faz parte da nossa cultura, até certo ponto.
O coscuvilhar, a bilharquice, a calhandrice, e outros similares, são isso mesmo. Uma forma das pessoas comentarem a vida dos outros, de forma a não comentarem a sua própria que, pelos vistos, deverá ser bem menos interessante que a alheia.

Por isso quando me rotulam e apelidam nomes sem me conhecerem, até me dá um certo gozo ir até ao fundo da questão, nem que seja por curiosidade mórbida feminina.
Hoje fiquei a saber que era a menina inglesa vista por aquele senhor. Ainda bem que falámos ou nunca se desmistificaria a ideia que o tal senhor tinha de mim. E deu para rir, pois claro.

Também acho muita piada de ir a passear na Ericeira do meu coração, e os próprios turistas me perguntarem coisas em inglês. Confiantes de que sou uma conterrânea dum qualquer país da Europa do Norte, onde as senhoras altas, branquinhas e sardentas são uma vulgaridade.
"No, I'm not swedish, but tell me if I can help you out with the map".

E acho um piadão.
Nós os Portugueses, somos de facto um dos povos mais desenrascados ao nível do falar línguas estrangeiras, ao nível do vingarmos profissionalmente num país que não é o nosso e, somos efectivamente um dos países que mais descobertas de outros (países) tomou a si, ao longo dos séculos. Acho que não é de estranhar portanto esta nossa parecença com tudo e todos, somos afinal um povo do Mundo.

E cá para mim, mais vale sê-lo que parecê-lo.
Povo do Mundo.

"Em perigos e guerras esforçados
Mais do que prometia a força humana
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram"
In Lusíadas, Luís de Camões

































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